4 de outubro de 2010

Concerto para flauta-vértebra

Iremar Marinho

Em vez de poeta, sou
o homem do megafone.
Com a palavra no trombone,
anuncio, à luz do dia,
toda tessitura lírica,
todo poema do mundo
para ruir num instante.

Se eu me chamasse Raimundo,
se eu conhecesse Drummond,
se eu visse Pedro Nava,
ruiria num segundo
todo edifício de ossos,
toda escultura-palavra.

Se fosse eu Mayakóvski,
seguraria o gatilho
da palavra invertebrada
da revolução vencida
por um tiro atrás da porta.

Todo poema do mundo,
toda construção-palavra
ruindo por um instante,
no lampejo do estampido,
num sopro da flauta-vértebra.

(A mais-valia da bala,
o mundo em desabalada,
uma balada de outubro,
um tiro no dia rubro
ruiu a trama delírica
da revolução-malogro).

Eu não me chamo Raimundo,
nem Drummond nem Pedro Nava,
só choro às margens do Neva
junto aos mortos de Akhmátova.

3 comentários:

  1. Bela homenagem aos grandes nomes da poesia.

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  2. Amiga Gerana,
    Sou envaidecido, além de agradecer
    por sua visita e comentário
    de quem sabe o que diz
    sobre poema e criação artística.
    Abraços!

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  3. Passei para retribuir e agradecer sua visita ao meu "cantinho", mas tive a grata surpresa em deparar-me com a densidade de seus versos! Portanto, sinto-me honrada em tamanho talento estar a seguir o meu Blog. Obrigada e parabéns!

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